sábado, 14 de fevereiro de 2009

Manuel Freire - Pedra Filosofal

Fiquem com uma das canções mais bonitas da música popular portuguesa e, simultaneamente, com um dos poemas mais belos da poesia portuguesa: Pedra Filosofal, um poema de António Gedeão, cantado por Manuel Freire.



Pedra Filosofal


Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.


eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.


Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.


Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.

António Gedeão in Movimento Perpétuo, 1956

4 comentários:

Anónimo disse...

É, sem dúvida, um excelente poema de António Gedeão! Ainda não conhecia e gostei imenso. Para completar a minha satisfação total, este poema foi interpretado por uma voz magnífica, Manuel Freire.

Djalme Lopes, 11ºJ

Anónimo disse...

Este trabalho poético encantou-me muito.

Vasco PS disse...

Música eterna.

Mara disse...

O comentário do Vasco diz tudo! Nada mais há acrescentar.