A violência começou há uma semana, alastrou a vários bairros e fez 22 mortes, a maioria pessoas que fugiram à crise no Zimbabwe
Casas incendiadas, pessoas mortas à pancada, uma pelo menos queimada viva; multidões em fúria, de pedras e paus na mão; mulheres, homens e crianças a procurar refúgio em centros sociais, esquadras da polícia e igrejas; milhares de estrangeiros a fugir dentro da África do Sul depois de aqui terem procurado refúgio, fugidos do Zimbabwe. Serão seis mil pessoas em fuga, segundo a BBC on-line. A violência começou há uma semana no bairro de Alexandra, perto do centro de Joanesburgo, onde morreram duas pesssoas, mas estendeu-se no fim-de-semana a outros townships nos arredores da cidade. Apesar do forte dispositivo de segurança, os motins recomeçaram ontem às primeiras horas da manhã. O balanço avançado pela polícia era ontem de 22 mortes e 217 detenções. Os principais alvos da violência xenófoba dos gangs vivem nesses townships, subúrbios de Joanesburgo, e são os mais três milhões de zimbabweanos que emigraram para a África do Sul, muitos deles nos últimos anos para fugir à crise económica e política no seu país. Imigrantes de Moçambique e do Malawi também têm sido al-vos. Entre as vítimas, haverá pelo me-nos dois moçambicanos. As forças policiais e de segurança dispõem de "recursos suficientes" e por isso "não se espera que a situação saia fora de controlo", disse ao PÚBLICO o analista e director do Instituto para os Estudos de Segurança, em Pretória, Jakkie Cilliers. Mas a África do Sul, país escolhido para acolher o Campeonato Mundial de Futebol de 2010, atravessa uma crise "grave" que "está a alastrar", reconhece. Repórteres escreveram, no fim-de-semana, que o centro de Joanesburgo estava temporariamente transformado em "zona de guerra" e os Médicos sem Fronteiras falaram de "uma situação típica de refugiados". A situação foi condenada pelo Presidente Thabo Mbeki e pelo seu rival que assumiu a liderança do Congresso Nacional Africano (ANC) em Dezembro, Jacob Zuma, que foi vice-presidente de Mbeki. Mas ambos são acusados de nada terem feito para prevenir a situação. O Presidente sul-africano anunciou a constituição de um grupo de trabalho para analisar a violência, mas não escapou às fortes críticas dos principais jornais por ter optado pelo diálogo com o re-gime do Presidente Robert Mugabe, quando isso em nada ajudou a impedir a grave crise económica e política no Zimbabwe. O país entrou em colapso e muitos zimbabweanos emigraram, a maioria dos quais para a África do Sul. "Se o Presidente Mbeki e o seu vice Jacob Zuma tivessem agido, há nove meses, não estaríamos onde estamos hoje", escrevia ontem o Times da África do Sul, no seu editorial. E fazendo eco da condenação geral da violência, o Cape Argus evocou também em editorial o "coro de repúdio, o consenso de que [esta violência] envergonha o país". O Governo também é apontado por não ter levado a sério o problema da xenofobia no país e por não ter resolvido os problemas mais prementes das populações mais pobres. A pobreza extrema e o medo de ficar de fora num país onde o desemprego chega aos 40 por cento estarão na origem desta ira, que toma a forma de "ódio" - a palavra correu ontem as primeiras páginas dos jornais sul-africanos. Mas este é um fenómeno com história. "Historicamente, o apartheid não só separou a comunidade branca da comunidade negra, mas também isolou a África do Sul do resto do continente, o que criou entre os sul-africanos um sentimento xenófobo", diz Jakkie Cilliers. Para este investigador sul-africano, os motins "reflectem o falhanço das políticas do Governo sul--africano em matéria de política externa, com "um apoio a Robert Mugabe no Zimbabwe" e quanto às políticas internas, económicas e sociais. O Zimbabwe é pois outro elemento-chave: os zimbabweanos, que recentemente afluíram em massa para a África do Sul, estão mais bem preparados para competir no mercado. O país teve, pelo menos até agora, um bom sistema de ensino, melhor que o sul-africano, explica Cilliers. "Os zimbabweanos constituem uma ameaça na medida em que podem competir com os sul-africanos." Os moçambicanos, enquanto imigrantes ilegais, também são vistos como uma ameaça, embora diferente. "Como todos os imigrantes ilegais em qualquer país, estão dispostos a aceitar qualquer emprego e qualquer salário." São "os mais pobres dos pobres" que protagonizam esta violência, diz. O que começou por ser "algo de inesperado", alastrou. E isso aconteceu pelos altos níveis de frustração, ira e medo de uma grande parte da população. "As pessoas pobres vêem que há muito dinheiro mas não vêem mudanças nas suas vidas."
5 comentários:
A história repete-se…
Parece que foi ontem que os povos negros deste país se libertaram do apartheid que se fez sentir durante vários anos.
Agora infelizmente já não se fala de apartheid mas sim de xenofobismo puro, ou seja o ódio profundo por todas as população não autóctones de um determinado país. Neste caso concreto a xenofobia dirige-se aos milhares de imigrantes zimbabweanos que emigraram nos últimos anos para fugirem à grave crise económica e política que se faz sentir no Zimbabwe.
Até então foram relatadas várias casas incendiadas, várias pessoas mortas à pancada, uma queimada viva, entre outros casos alarmantes que nos fazem horrorizar perante tamanha violência isto tudo porque os autóctones sul-africanos acreditam tão doentiamente que estes 3 milhões de zimbabweanos vieram apenas ocupar os postos de trabalho que deviam ser da população sul-africana (segundo eles afirmam).
A intervenção da polícia na contenção deste motim não tem sido nada mais que horripilante. Esta intervenção, mesmo que violenta, na minha opinião é essencial mas não deixo de ficar alarmado com as 22 mortes que a polícia sul-africana causou ao impedir o avanço deste movimentos xenófobos.
Acho verdadeiramente chocante que em pleno século XXI este género de situações se perpetue sem qualquer intervenção internacional que se capaz de arbitrar este conflito e tentar apaziguar os sentimentos xenófobos que se fazem sentir neste país.
Tens toda a razão Pedro, esta situação é horripilante...e a mim choca-me que o povo negro de Zimbabué viva neste ignorância e continue a matar inocentes como se de animais se tratasse.
Acho tudo o que havia para dizer o meu amigo Pedro disse e muito bem. Isto é horrível e dá pena até de falar.
Joanesburgo é a cidade mais perigosa do mundo (e dispõe até de centenas de câmaras de filmar espalhadas por toda a cidade e de um controlo especial por parte da policia dessa cidade) e nem por isso as coisas deixam de acontecer... Parece que já nem é deste século. Toda esta xenofobia penso que nos incomoda a todos...
Este caso é, sobretudo, triste. Segundo a minha visão da vida, sentimentos como a xenofobia não deviam existir. Mas não creio que, não estando dentro dos acontecimentos e não vivendo as terríveis provações destes povos, me possa pronunciar acertadamente acerca de tudo isto. O mundo está mesmo perdido. Espero que esta questão seja solucionada rapidamente.
Quem diria que um dos países, aparentemente mais calmos e estáveis do continente africano, estaria neste momento a passar por esta situação. A verdade é que todos os países têm os seus problemas, uns mais graves do que outros, mas como é comum a todos os problemas necessitam de uma solução. Isso é inevitável. A verdade é que a África do Sul acabou por criar estas situações de ódio e de violência entre os seus cidadãos. Verdade justificada pela sua História recente e que os envergonha internacionalmente.
Agora a situação é um pouco distinta, e países em seu redor começam a ter o pais debaixo de olho pois percebem que é um pais onde poderão ter melhores condições e oportunidades. Assim fizeram muitos imigrantes do Zimbabwe e também de Moçambique. Os primeiros afectados por crises económicas e politicas no seu pais de origem e os seguintes movidos pela vontade de melhorar as suas oportunidades. A crise de desemprego começa a alastrar-se e consiste na principal causa para revoltas, motins e consequentemente, atitudes violentas.
Esta mão-de-obra é por sinal uma ameaça para África do Sul, pois sendo mais barata e que aceita todas as condições, poderá também trazer graves problemas sociais e económicos para muitos dos trabalhadores.
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