Líder dos rebeldes avisa que as forças de paz devem "limitar-se às operações humanitárias, se não quiserem ser consideradas forças inimigas"
Há casas cheias de corpos. Doze, cinco... famílias inteiras mortas, a jazer no chão. Na rua, o mesmo cenário. Alguns jornalistas já descreviam cenários de terror na República Democrática do Congo (RDC) e relatavam assassínios sumários. Ontem, pela primeira vez, as Nações Unidas declararam que foram cometidos "crimes de guerra" nos combates que opõem as milícias pró-Governo aos rebeldes tutsis.Não são difíceis de encontrar os testemunhos a dar conta de assassínios sistemáticos, sobretudo de homens adultos. Mesmo no caso de Jumy Kasereka, um professor, demasiado doente com malária para conseguir fugir da aproximação dos rebeldes. A sua mãe, Felista Maska, contou ao jornal Guardian as certezas que recebeu do filho: não seria um alvo porque eles veriam que era inofensivo. Felista Maska decidiu ficar também, em vez de seguir com as dezenas de milhares que os homens do Congresso de Defesa do Povo, de Laurent Nkunda, expulsaram de Kiwanga, na província do Kivu Norte, após tomarem a cidade às milícias hutus. Ficou para ver os soldados irromper pela sua casa. "Não fizeram perguntas. Mataram-no simplesmente."A denúncia de "crimes de guerra" já tinha sido feita - ainda na sexta-feira a Human Rights Watch usou o termo. Ontem, foi a vez de um porta-voz da ONU na RDC, Alan Doss. "Condenamos, deploramos e relembramos aos diferentes grupos que o direito internacional é muito claro nesta matéria: são crimes de guerra que não podemos tolerar", cita a agência AFP. "Queria repudiar as violações muito graves aos direitos humanos... na região de Rutshuru [no Leste] nos últimos dias. Infelizmente, encontrámos matanças na localidade [de Kiwanja] e ao lado, incluindo civis visados por grupos armados", disse numa conferência de imprensa em Goma, a capital da província. A Cruz Vermelha refere também que várias centenas de civis - professores, funcionários da missão da ONU (MONUC), agricultores idosos -, que estavam demasiado doentes para fugir, foram vítimas.
Situação catastrófica
"A situação é catastrófica, não existe outra palavra", desabafou um dos seus responsáveis à Economist. Da cidade de Kianga saíram 35 mil pessoas, desde que foi tomada pelas forças de Nkunda, a seguir a terem ficado com o controlo da vizinha Rutshuru, na semana passada. Concentravam-se ali hutus e outros que fugiram a anos de confrontos no Norte e Oeste.Um membro das forças de Nkunda admitiu à revista britânica que os seus guerrilheiros "neutralizaram" homens vestidos à civil que, segundo ele, pertenciam claramente às milícias Mai Mai, que juntamente com o Exército congolês têm combatido os rebeldes tutsis - separados, segundo um repórter da AFP, por uma zona tampão de apenas 500 metros. As forças da MONUC, que contam com 17 mil capacetes azuis (a maior missão da ONU em todo o mundo), admitem não conseguir proteger um país que tem o tamanho da Europa Ocidental, onde se assiste ao pior nível de violência no mundo. Na sexta-feira, a cimeira destinada a aplacar o conflito acabou com o pedido de abertura de um corredor humanitário para que seja possível chegar a milhares de pessoas que estão em campos de refugiados e também de um cessar-fogo."Estão a falar num cessar-fogo e num corredor humanitário. Nós já pedimos isso", comentou Nkunda por telefone à Reuters. E avisou que as forças de paz regionais a ser enviadas devem "limitar-se às operações humanitárias, se não quiserem ser consideradas forças inimigas". "Se vierem para apoiar o corredor, não tenho problemas com isso. Se vierem por motivos políticos, não é pela paz. Estarão do lado do Governo."
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